"Quando o assunto é violência no namoro o objectivo é estabelecer os
limites entre o que é amor e o que é violência. Embora pareça simples,
nem sempre as pessoas têm noção desses limites e muitos vivem relações
violentas convencidos de que é tudo normal, de que é amor.
Um
estudo realizado no âmbito do projecto Artways – Políticas Educativas e
de Formação contra a Violência e Delinquência Juvenil comprovou isso
mesmo concluindo que 27% dos jovens inquiridos consideram normal a
violência psicológica e, pelo menos, 7% já foi vítima de agressão
física. A violência psicológica é, por vezes, a que passa mais
despercebida, mas que pode acontecer de várias formas que podem até ser
muito simples. Actos como pegar no telemóvel do companheiro sem
autorização ou proibir o uso de determinadas peças de roupa são
considerados normais numa relação. “Parecem inócuos, mas a ideia de
controlo, de que o meu namorado é minha posse, já são sinais de
violência”, avisa Maria José Magalhães, presidenta da União de Mulheres
Alternativa e Resposta (UMAR).
O estudo apoiado pelo
Programa Cidadania Activa da Fundação Calouste Gulbenkian apresentou
esta terça-feira os primeiros resultados. Depois de questionar 456
jovens de 32 escolas do distrito do Porto, entre os 11 e os 18 anos, os
resultados não foram animadores. Para além de avaliar se os jovens já
experimentaram situações de violência no namoro, analisou também a sua
perspectiva sobre o assunto: o que achavam de determinadas atitudes
dentro de uma relação, o que era considerado violência e o que era
considerado normal.
A violência psicológica não é a única a ser
considerada normal. O estudo mostra que 63 dos 456 jovens inquiridos
acham natural a violência física desde que não deixe marcas. Mas, a
quantidade de rapazes a achar que a violência física é natural e
legitimada é quase o dobro da quantidade de raparigas. Para Maria José
Magalhães, o problema está na cultura do “amor cego”, “de que o amor
significa posse, de que a paixão é irracional e de que as pessoas podem
fazer o que quiserem com o outro.” “Para nós, esta cultura está na base
do femicídio, da violência doméstica, da falta de respeito pelos
direitos humanos em geral”, refere, alertando para os resultados do
inquérito sobre a reacção dos jovens depois da agressão: pelo menos 12%
diz que acabou por perdoar o/a agressor/a e pelo menos 8% diz não ter
dado importância ao sucedido, apenas 4% optou por pedir ajuda.
Entre
as respostas, destaca-se ainda o facto de 31% dos rapazes contra 10%
das raparigas considerar legítimo pressionar para ter relações sexuais.
Aliás, 2% dos jovens considera já ter sido vítima deste comportamento.
Com os dados obtidos no estudo, a presidente da UMAR conclui que o
trabalho que tem sido desenvolvido nesta área "ainda não é suficiente,
precisamos de mais”.
O projecto Artways tenta dar um passo em
frente na necessidade de consciencialização para a violência no namoro.
Durante o ano lectivo 2014/2015 realizaram 15 sessões com os alunos das
32 escolas inquiridas com o objectivo de utilizar a arte para alertar
para o assunto. Mais do que remediar, a UMAR pretende prevenir, “temos
de intervir logo desde já o junto dos eventuais futuros agressores”.
Encontraram, para isso, a resposta na arte. A intervenção junto dos
jovens, nas escolas, tem sido feita com recurso à música, teatro, jogos
didáticos, vídeo, entre outras formas de expressão. O “sermão e missa
cantada” são formas de ensino que aqui não funcionam, “talvez na escola e
no sistema judicial, mas não desta forma com os adolescentes”.
A
UMAR apela à necessidade de pedir ajuda, saber o que se deve fazer e a
quem, “a sociedade ensina que as pessoas devem ser assertivas,
independentes. A verdade é que também é preciso ensinar solidariedade e a
necessidade de falar, de pedir ajuda”. Dados
da PSP mostram o número de participações de casos de violência no
namoro aumentou para o dobro de 2013 para 2014, registando mais de
quatro participações por dia em 2014."
Retirado do jornal Público
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